segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Eu usarei preto (I´ll use black)




O momento de levantar peso é algo muito sagrado a um powerlifter: é a materialização de horas de treinos e dedicação colocadas à prova em um tablado para que seja rigorosamente julgado pelos árbitros mais experientes e justos que se possa encontrar. E isso justifica toda dor e todo sofrimento para se chegar até ali. É um sentimento de pertencimento e meritocracia que são indescritíveis. só quem viveu de verdade, sabe o que é (porque nesse esporte, dá pra ir num campeonato mundial numa cidade do lado da sua casa e ganhar em uma categoria que só tenha você e se dizer campeão do mundo).
Porém, no meu caso, sou um atleta-professor-treinador. Eu vivencio a experiência de levantar peso e também tenho a honra de ensinar pessoas e atletas. Fui formado pra isso em, pelo menos, 7 anos dentro de universidades diversas. Esses anos todos me deram algo que esse atual governo tanto teme: senso crítico. Tenho senso crítico pra ver toda a crise batendo a nossa porta. Crise essa causada por incompetência administrativa, corrupção e a insuflação de um estado ao qual não temos mais como pagar.
Por isso, estarei usando preto nesse campeonato. É um luto pela forma arbitrária de como tem sido gerido o meu, o seu e o nosso dinheiro. Não existe dinheiro público, caro leitor: cada centavo gasto por qualquer governo é um dinheiro que deixa de estar na mesa de um trabalhador. São sonhos adiados, são dívidas feitas (e altos juros cobrados), são custos que sobem e impedem sonhos. Sonhos de atletas que deixam de competir, de chefes de família que deixam de viajar no fim do ano ou de donas de casa que deixam de comprar comida para alimentar seus filhos.

Ninguém deve ter mais ou menos protagonismo nisso tudo, afinal, uma crise afeta todo mundo. Se o pobre acha bonito o rico ficar menos rico pois acha que isso é uma “justiça social”, você se enganou: ele mais pobre jamais vai te fazer mais rico. Redistribuir renda e diminuir a desigualdade social passa pela educação e uma sociedade verdeiramente meritocrática. Mas esse texto não se refere a isso e sim os motivos do meu luto.
Usarei preto por todos aqueles que não puderam estar conosco nesse campeonato. Estarei de luto por todos aqueles que pagam, aumento após aumento, sua conta de água, sua conta de luz e os mais de 30% de aumento recente no preço do combustível. Estarei de luto por quem vai, semana após semana no mercado e encontram os preços cada vez mais altos. Estarei de luto por todos aqueles que não conseguem ter acesso a uma educação de qualidade pois a recente política desse país acabou com isso. Estarei de luto por todos os professores universitários que são obrigados a ganhar menos de 40 reais a hora com um mestrado porque se instaurou um monopólio da educação privada nessa país. Eu estarei de luto por toda classe média que vem, nos últimos 20 anos, pagando sozinha a conta desse país. Eu estarei de luto pelos menos favorecidos que foram iludidos pelo discurso de uma pobreza socializada para que ele se sinta privilegiado. Eu estarei de luto por todos aqueles que lutam por um país melhor e falharam na burocracia implantada pelo estado. Eu estarei luto por cada empresa que tenta sobreviver nesse país com a maior carga tributária do mundo. Eu estarei de luto por cada funcionário que recebe seu hollerith e vê centenas ou milhares de reais descontados e não recebe UM serviço decente do governo. Eu estarei de luto por cada serviço essencial privado que o trabalhador é obrigado a pagar por não ter o mínimo garantido pelo serviço público. Eu usarei luto por não mais acreditar no país em que eu nasci...

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